quarta-feira, 25 de dezembro de 2013


'Então,
que o tempo
mostre o que
o sentimento
não conseguiu
convencer.'




(Stella Marla - Natal2013)

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Comiseração

Era da cócega que ele sentia no pé, que ela tanto lembrava.
Da sua gargalhada solta.
Do olhar pueril contrastando com suas mãos firmes.
Lembrava do soluço repentino que a fazia rir descontroladamente.
Das músicas mal decoradas.
Das piadas bobas.
Dos arremedos.
Nem tanto do sexo, que, sim, era incomparável,
mas do beijo, que os fundia num só.
Era da intensidade perfeitamente encaixada, que ela lembrava.
Era dos seus olhos dentro dos dela,
do suor misturado
dos ruídos
dos pingos de chuva batendo à janela
da desnecessidade das palavras
das horas que passavam despercebidamente
do silêncio absoluto do lado de fora...
era dos detalhes, que ela lembrava.
Nada pesava.
A não ser a falta.
A saudade absurda.
A abstinência.
Tremura.
Insônia.
Insaciedade.
Inapetência.
Foi quando viu no espelho o reflexo da dor.
E o que a fazia sorrir, agora doía na pele, na alma.
Lembrou de João Bosco, que, impiedosamente, cantou:
'... bate é no champanhe que borbulhava na sua taça
e que borbulha agora na taça da minha cabeça...'
E agora? - perguntava a si mesma
ao olhar as próprias mãos completamente vazias,
mas ainda com a forma do seu corpo.
Ao olhar sua cama completamente vazia,
mas ainda com a forma do seu corpo.
Ao olhar o próprio corpo completamente vazio,
mas ainda com a forma do seu corpo.
Quando se indagava sobre o fim de tudo,
entendia bem que não era uma questão de fim,
mas de completo descontrole sobre a força daquilo que independia deles.
Talvez não tivesse de ser.
Mas foi.
A hora era exatamente essa: a da comiseração.
Porque ainda bebia naquela taça onde ele pôs sua boca.
Porque ainda sentava àquela mesa daquele lugar
onde trocaram olhares e gargalhadas.
Porque ainda ouvia o seu sussurro perdido pelo quarto.
Porque ainda sentia o arrepio desfilando por sua pele.
E pele tem memória.

(Stella Marla - 05Dez2013)

sexta-feira, 15 de novembro de 2013



'Fiz um pacto com o vento e
agora ele me avisa quando
o mar é de poesia.'

(Celso Sisto)
 
 
 
 
 

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Quintana disse...

'... todo desafio é mais um convite à luta que a gente enfrenta com toda disposição de tentar algo NOVO, de NOVO e de NOVO, e quantas vezes for preciso.
Essa idade tão fugaz na vida da gente chama-se PRESENTE e tem a duração do instante que passa.'


Obrigada à 3ª feira, da qual tantas vezes duvidei...

(Filosofando no boteco...)

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

'Quando nada parece dar certo, vou ver o cortador de pedras martelando sua rocha talvez 100 vezes, sem que uma única rachadura apareça. Mas, na centésima primeira martelada a pedra se abre em duas, e eu sei que não foi aquela que conseguiu isso,
mas todas as que vieram antes.'

(Jacob Riis)

domingo, 20 de outubro de 2013

segunda-feira, 23 de setembro de 2013


Ex-namorado

Ele é meu ex-namorado.
Na verdade, ele 'era' meu ex-namorado.
Só agora nos despedimos formalmente, de um jeito que termina com qualquer final feliz de novela das sete e até com o prefixo 'ex'.
Porque 'ex' foi alguma coisa.
Porque 'ex' faz parte da nossa história, quer queiramos ou não.
Acontece que, nos meus critérios, venho tentando considerar 'ex' quem, de alguma forma, acrescentou alguma coisa... uma lembrança ou atitude positiva, a espontaneidade de um sorriso, uma vontade de estar ali, naquele momento.
Mas ele conseguiu acabar com o que eu guardava de mais sagrado a seu respeito.
Havíamos sido amigos de infância.
Um amigo apaixonado pela garotinha dos olhos azuis que morava no quarteirão de sua tia.
Até essa 'derradeira despedida', era muito mimoso lembrar, por exemplo, que a sua foi a única visita que recebi quando tive hepatite.
Um menino libriano que, sem medo do meu jeito desfigurado e amarelo, foi me ver, saber como eu estava.
Vários anos depois, na época da faculdade, namoramos.
Namoro breve, o tempo necessário pra ter certeza de que ele deveria ser exatamente o que sempre fora: um amigo muito querido.
A partir daí, nossas vidas tomaram rumos completamente opostos.
De tão opostos, em certo ponto ficaram terrivelmente parecidos.
Ainda assim, as lembranças pueris e juvenis estavam arquivadinhas. Porque faziam parte daquele álbum em que a gente mantém as figurinhas que não saem em duplicata, sabe? Pessoas que nos são caras pelo simples fato de existirem.
Então, nos reencontramos numa rede social. Aquela que une e desune nossos afetos tão rápido quanto um flash de luz.
E tudo foi retomado não a partir do nosso namoro de antigamente, mas do nosso convívio enquanto crianças.
Dividimos afinidades e músicas.
Dividimos amizades e experiências de mais de trinta anos depois.
Havia muito pra ser compartilhado sem qualquer menção ao nosso curtinho romance.
Era como se aquela fase simplesmente não tivesse existido.
Foi quando, então, tratamos de finalizar aquilo que não teve despedida.
'Terminamos' num dia em que minha opinião não combinou com a dele. 
Num dia em que, sem querer, acabamos comparando nossas vivências, nossos desencantamentos e o resultado de cada um após esses anos todos.
Num dia, o primeiro e único, em que não respeitamos nossas preferências tão avessas e tão iguais.
Por mim, não teria 'acabado' assim.
Por mim, ele teria permanecido naquele álbum de relíquias.
Mas, nas profundezas do que a psicanálise muito bem explica, entendo que houve, por parte dele, a necessidade da ruptura definitiva, ainda que um motivo tão tolo tenha sido o grande pretexto.
Aquela discussão do fim, a morte formal do que, pra mim, já estava morto e enterrado, aquela despedida e o aceno de tchau... tudo o que não houve, agora existia: o tal protocolo que qualquer relacionamento exige.
E terminamos, também, com a esperança de sermos bons amigos. Talvez porque nunca tenhamos sido.
Porque nossa história não começou com uma amizade, creio que não tenha alcançado a proeza de resultar numa boa amizade.
Whatever... se tudo que nasce precisa ter um fim, aqui jaz mais uma história.
Bonita como poucas, mas igual a muitas que não suportam o 'peso do afeto'.
Guardadas as devidas proporções, Kundera tinha razão:
'O acaso tem seus sortilégios; a necessidade, não. Para que um amor seja inesquecível, é preciso que os acasos se encontrem nele desde o primeiro instante, como os pássaros nos ombros de São Francisco'.
 
(Stella Marla - 23Set2013)

sexta-feira, 20 de setembro de 2013


Saravá!

Dia desses, fui num 'Saravá'!
Ogunhê, meu pai!
Minha mãe, Odoyá!
Me puxaram pra dançar,
deram charuto pr'eu fumar
e Pombagira veio me abraçar
Laroyê, 'Maria Bonita'!
Entre sorrisos e risadas,
deu champanhe pr'eu tomar
Contou da minha sina,
falou das 'voltas por cima'
e que meu destino é amar
Disse que morro velhinha,
que nunca fico sozinha
e que minha trilha é lutar
Falou em segredo
e pediu que eu não tenha medo,
muita coisa verei mudar
Tocou no meu peito,
pitou a cigarrilha,
disse que tudo tem jeito,
'ainda mais de quem és filha'. 
Puxou ponto de Ogum,
me benzeu com seu 'bastão',
sossegou meu coração
Mandou acender vela
e chamar por ela
sempre que quiser proteção
E que eu faça o 'agradecido'
pela saúde e o 'ganha-pão'
Deu arruda pro sapato
e figa pra pulseira
Defumou meu patuá,
disse pr'eu usar a vida inteira.
Bati cabeça no congá e
Saravá, meu Pai Ogum!
Saravá, Mãe Iemanjá!

(Stella Marla - 19Set2013)

domingo, 8 de setembro de 2013

As Telas e Elas

Paquero ela,
ela dança Peggy Lee
Sem luz nenhuma
acendo um free
Quando eu a vi, vi muito mais
do que eu queria enxergar

Que amor é esse que bateu em mim
Na parede um quadro falso de Klimt
Quem dera ela toda em mim ao se tocar
Rompendo o teto todo, a telha e o luar
Quando me despi, rompi minha paz
De tudo sou capaz
Que amor é esse que me causa um nó
Da parede roubaram um Miró
Pernas, pés, cabelos, peitos lindos que doem a íris
Meu erro, minha escravidão, meu violão, meu Ramirez
Eu não quero mais viver assim
Eu não quero mais viver assim
Ela pensa que me engana, deixo ela pensar
Daí não dura uma semana ela já quer voltar
Não só aceito e ainda me enfeito
Troco a fronha e o lençol
Que amor é esse que irrompe o mar
Na parede um traço Renoir
Quem dera ela e mais duas pra misturar
A força que nos prende e solta faz delirar
Quando eu chorei, perdi e ganhei
E agora quem eu sou?
Que amor é esse que me faz querer
Na parede um autêntico Monet
Bordô, carmim, magenta, cerúleo, AZUL
Ciúme, desejo, medo, fogo, belo visu
Eu não quero mais viver assim
Eu não quero mais viver assim

(Ana Carolina)

domingo, 1 de setembro de 2013


'E, então, as terças-feiras passaram do cinza desbotado pro azul em todas as suas nuances...'

(Stella Marla - 1ºSet2013)

domingo, 25 de agosto de 2013


'As afinidades são autoexplicativas.'

(Stella Marla - 25Ago2013)

domingo, 11 de agosto de 2013

Francisco

Não, não sentamos pra brincar no ‘tapete da sala de estar’.
Tão pouco me ensinou a caminhar.
Ele, mesmo, já desaprendera.
Não, não brincamos na pracinha.
Nem me ensinou a ler e escrever.
Então, também não tivemos aquela conversa de pai pra filha.
Eu, na minha inocência, gostava da sensação de suas mãos trêmulas em meus cabelos.
Sentia que o cheiro do meu pai era diferente do da minha mãe, mas, de qualquer forma, eu sempre o esperava chegar em casa.
Do seu jeito cambaleante, ele me levava pro seu quarto e, com a brasa do palito de fósforo com o qual ele acendia o cigarro, desenhava, no escuro, figuras de todos os bichinhos que uma criança de três anos pudesse conhecer.
E assim, eu dormia em seu peito.
Aquele era um momento verdadeiramente mágico no meio de uma realidade falida.
Pra aceitá-lo e não estragar os poucos momentos perfeitos que passamos, escolhi não lembrar de todos os episódios ruins que presenciei e não entendi.
Quando o vi submerso naquela banheira de louça branca, curando uma de suas violentas ressacas ao som de ‘Além do Horizonte’, do Roberto, preferi guardar no meu ‘jogo psicológico de sobrevivência’ a imagem do seu sorriso tonto e fazer dessa música um 'hino de esperança'.
Soube mais de meu pai pelo que os outros contaram.
Alguns disseram que tenho seu jeito, seu signo, sua boca e seu senso de humor.
Outros contaram sobre as sacanagens daquele adolescente ariano... e sobre a forma debochada de brincar com as pessoas que o cercavam.
Quando, num ato de desespero, minha mãe decidiu trancá-lo em casa e fugir conosco pela janela, preferi fazer daquele momento ‘a grande aventura de nossas vidas’. Uma fuga heroica!
Mas... e os bichinhos do escuro??
A partir daí, foi só o resto da vida lembrando do único momento perfeito ao seu lado.
E foi, também, o resto da vida tentando entender e aceitar uma saudade que não tem fim.
Como eu queria ter levado uma bronca sua, um puxão de orelhas, um conselho, um elogio...
Como eu queria ter aprendido a dirigir com ele...
Como eu queria ter comemorado com ele a nota dez na redação, a aprovação no vestibular, no concurso, na cantada investida...
Como eu queria ter comparado infinitas vezes minha boca a sua, meu sorriso ao seu...
Como eu queria ter podido carregá-lo no colo quando tanto precisou.
Mas, como também tínhamos em comum a ‘estranha mania de ter fé na vida’, ‘pode ser que daqui algum tempo haja tempo pra gente ser mais’.

(Stella Marla – 11Ago2013)

terça-feira, 6 de agosto de 2013

'Não tenho a mínima pretensão de estar à curta distância de Deus; mas tenho evitado certos demônios, inclusive os meus.'

(Stella Marla - 06Ago2013)

domingo, 4 de agosto de 2013

Da Janela

Não. Não era só a calça desfiada, ou o tênis desamarrado.
Não era o seu cabelo desalinhado, nem a mochila em suas costas.
Havia algo vindo da sua pele. Um frescor juvenil, um aroma de 'coisa nova'.
Se fosse pra esboçar seu rascunho, diria que não deveria ter problemas. Diria que ainda experimentava a vida. Ela parecia feliz. E isso, tão raro nos dias de hoje, se tornara seu encanto.
Já não era adolescente, mas aquele ar de menina livre se mantinha.
Era como se tudo o que realmente importasse, estivesse dentro daquela mochila.
Eu me perguntava que alma era aquela, que, de tão leve, pesava em meus pensamentos.
E, todos os dias, no mesmo horário, eu, da janela do escritório, vislumbrava o desfile dos seus cabelos livres, tão livres quanto o seu olhar. Um olhar que não me via, mas que, a partir daqueles instantes, eu passava a ter um dia melhor.
Eu, com medo de estragar a magia que me ligava à ela, escondia-me atrás da cortina. Assim, além de me proteger, cuidava dela e, ao mesmo tempo, a destacava de todo o resto.
Então, meus olhos a seguiam por aquele quarteirão sem perder um passo seu e, quando ela virava a esquina, eu já me punha a aguardar pelo próximo dia, pelo próximo 'encontro'. Ah, que raiva eu sentia daquela esquina!
A partir dali, minha imaginação produzia imagens sobre o que acontecia longe dos meus olhos: até onde ela ia, onde entrava, o quê fazia... Mas, de que maneira eu saberia, se eu sequer cogitava interferir naquela rotina e correr o risco de quebrar a beleza do pouco que me fazia tão bem?
E assim, os dias corriam, a vida seguia.
E, por meses a fio, religiosamente, eu estava lá, naquela janela nada indiscreta.
Foi quando, num certo dia ventoso, uma folha de papel com o seu desenho voou de minha mesa e passou pelas vidraças abertas.
Constrangida e com receio de que aquilo fosse o suficiente para atrapalhar aquela paisagem, intacta há tanto tempo, tentei guiar seu 'pouso' com a força do meu olhar.
Até hoje não sei se meu olhar me traiu, ou se ele nunca teve a menor influência sobre minhas vontades.
Aquela folha de papel aterrissou logo à frente de seu próximo passo.
Foi quando ela a apanhou.
Apanhou e leu.
Leu e me olhou.
Olhou e sorriu.
Sorriu e me chamou.
Estremeci e titubeei, mas, em milésimos de segundo, refleti e concluí que não perderia algo além do que concretamente nunca tivera.
Desci e, daquele ponto da calçada, mirei aquela janela.
Percebi que ela era bem menos discreta do que eu supunha e que as personagens dessa história já eram íntimas, cada uma em seu silêncio.
Então, em silêncio, seguimos pelo quarteirão.
E viramos a esquina.

(Stella Marla - 04Ago2013, da série 'Tirados da Gaveta')